sexta-feira, 18 de dezembro de 2009



Uma segurança é algo verdadeiro e bíblico

Em primeiro lugar, portanto, tentarei mostrar que uma esperança firme é algo verdadeiro e bíblico.
Conforme Paulo expressa a questão nos versículos no início deste capítulo, a segurança do crente não consiste em mera fantasia ou sentimento. Não resulta de um elevado espírito de júbilo natural, nem de um temperamento sanguíneo. Antes, é um dom real do Espírito Santo, proporcionado sem qualquer ligação com a constituição ou com os estados emocionais do corpo.Trata-se de um dom que todo crente em Cristo deveria buscar e ter como alvo. Em questões dessa natureza, a primeira pergunta que se impõe é esta: Que dizem as Escrituras? Dou a resposta sem menor hesitação. A Palavra de Deus, ao que me parece, ensina distintamente que o crente pode chegar a ter uma segurança confiante no que concerne à sua própria salvação.
Estabeleço, ampla e plenamente, como verdade de Deus, que o crente verdadeiro, o homem convertido, pode atingir um grau tão confortável de confiança em Cristo que, de modo geral, sinta-se inteiramente confiante de que recebeu o perdão dos seus pecados em sua alma, sentindo-se mui raramente perturbado por dúvidas, raramente desencorajado por medos, raramente aflito diante de indagações ansiosas. Em suma, embora contrariado por muitos conflitos internos na luta contra o pecado, esperará a morte e o juízo sem qualquer temor.
Afirmo que essa é uma doutrina constante na Bíblia.
Essa é a minha compreensão acerca da segurança do crente. Gostaria que os meus leitores a assinalassem bem. Não afirmo nem menos nem mais do que estou dizendo aqui.
Uma afirmação como esta com freqüência é contestada e negada. Muitos não podem perceber a verdade contida nela.
A Igreja Católica Romana denuncia a doutrina da segurança do crente nos termos mais desmedidos. O Concílio de Trento declarou terminantemente que “a certeza do crente de que os seus pecados foram perdoados é uma confiança vã e ímpia”. E o cardeal Belarmino, bem conhecido campeão do romantismo, intitulou esse conceito de “erro primário dos hereges”.
A maioria dos cristãos mundanos e indiferentes, dentro das próprias fileiras evangélicas, opõe-se à doutrina da segurança do crente. Eles ficam perturbados e ofendidos quando a ouvem. Não gostam que outros se sintam confortáveis e seguros, porquanto eles mesmos nunca se sentem assim. Se perguntarmos se os pecados deles foram perdoados, provavelmente responderão que não sabem! Não admira que eles não possam aceitar a doutrina da certeza da salvação.
No entanto, também há alguns crentes verdadeiros que rejeitam a idéia da certeza da salvação ou que procuram evitá-la como uma doutrina repleta de perigos. Consideram que ela quase chega a ser uma presunção. Parecem sentir que é uma humilhação legítima nunca se sentirem seguros, nunca se sentirem confiantes e por isso vivem em meio a certo grau de incerteza e suspense a respeito de suas almas. Essa é uma atitude lamentável e que produz grande males.
Admito francamente que há algumas pessoas presunçosas, que professam sentirem-se confiantes acerca daquilo que as Escrituras não garantem. Sempre haverá pessoas que pensarão bem a seu respeito, embora reprovadas por Deus, da mesma maneira que sempre haverá pessoas que pensarão o pior sobre si mesmas, embora Deus as aprove. Sempre acontecerão coisas dessa natureza. Jamais surgiu uma doutrina bíblica da qual os homens não pudessem abusar e apresentar imitações. A eleição divina, a incapacidade humana, a salvação pela graça – todas essas doutrinas são igualmente alvos de abusos. Enquanto perdurar o mundo, haverá fanáticos e entusiastas. Mas, a despeito de tudo isso, a segurança da salvação é uma realidade e uma verdade; os filhos de Deus não devem evitar crer em uma verdade bíblica meramente porque algumas a têm sujeitado a abusos.
A minha resposta a todos quanto negam a existência de um senso de segurança bem firmado e real é simplesmente esta: O que dizem as Escrituras? Se a segurança do crente não é ensinada ali, então nada terei para dizer a esse respeito.
Mas, porventura não disse Jó: “Depois, revestido este meu corpo da minha pele, em minha carne verei a Deus. Vê-lo-ei por mim mesmo, os meus olhos o verão, e não outros” (Jó 19.26-27)?
Não foi Davi quem disse: “Ainda que eu ande pelo vale da sombra e da morte, não temerei mal algum, porque tu estás comigo: a tua vara e o teu cajado me consolam” (Sl 23.4)?
E Isaías também não declarou: “Tu, Senhor, conservarás em perfeita paz aquele cujo propósito é firme; porque ele confia em ti” (Is 26.3)?
E novamente: “O efeito da justiça será paz, e o fruto da justiça, repouso e segurança, para sempre” (Is 32.17)?
Porventura, não diz Paulo na epístola aos Romanos: “Porque eu estou bem certo de que nem a morte, nem vida, nem anjos, nem os principados, nem as coisas do presente, nem o porvir, nem os poderes, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8.38,39)?
E não escreveu ele aos crentes de Corinto: “Sabemos que, se a nossa casa terrestre deste tabernáculo se desfizer, temos da parte de Deus um edifício, casa não feita por mãos, eterna, nos céus” (2 Co 5.1)?
W outra vez: “Temos, portanto, sempre bom ânimo, sabendo que, enquanto no corpo, estamos ausentes do Senhor” (2 Co 5.6)?
Não instruiu ele a Timóteo: “ Sei em quem tenho crido, e estou certo de que ele é poderoso para guardar o meu depósito até aquele Dia” (2 Tm 1.12)?
E não disse Paulo aos Colossenses: “Tenham toda riqueza da forte convicção do entendimento” (Cl 2.2)?
E também não foi dito aos hebreus: “Desejamos, porém, continue cada um de vós mostrando, até ao fim, a mesma diligência para a plena certeza da esperança”; “Aproximemo-nos, com sincero coração, em plena certeza de fé” (Hb 6.11 e 10.22)?
Não declarou Pedro expressamente: “Por isso, irmãos, procurai, com diligência cada vez maior, confirmar a vossa vocação e eleição” (2 Pe 1.10)?
Não deixou João registrado: “Nós sabemos que já passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos” (1 Jo 3.14)?
E novamente: “Estas cousas vos escrevi, a fim de saberdes que tendes a vida eterna, a vós que credes em o nome do Filho de Deus” (1 Jo 5.13)?
E, finalmente, não disse ele: “Sabemos que somos de Deus e que o mundo inteiro jaz do maligno” (1 Jo 5.19)?
Que podemos dizer em contrário e essas declarações apostólicas? Desejo falar com toda a humildade sobre qualquer ponto controvertido. Sinto que não passo de um pobre e falível filho de Adão. Entretanto, sou forçado a dizer que nos trechos que acabei de citar, percebo algo muito mais elevado do que as meras “esperanças” e “confianças” com que tantos crentes parecem se contentar. Vejo ali a linguagem da persuasão, da certeza, do conhecimento revelado; sim, vejo a linguagem de quem sente segurança. E, da minha parte, se eu tomar essas passagens bíblicas em seu sentido mais claro e óbvio, creio que a doutrina da segurança do crente é verdadeira.
Acrescente-se a isso, que a minha resposta a todos quantos não apreciam a doutrina da segurança do crente, como se isso fosse apenas presunção, é a seguinte: É impossível andar na presunção quando se segue as pegadas de Pedro, de Paulo, de Jó e de João. Todos esses foram homens que pensavam pouco de si mesma e eram extraordinariamente humildes, como talvez ninguém mais o tenha sido. E, no entanto, todos falaram sobre a sua condição espiritual com a mais segura esperança. Certamente, isso deveria ensinar-nos que a humildade profunda e a mais absoluta segurança são perfeitamente compatíveis entre si, não havendo qualquer conexão necessária entre espiritual e o orgulho.
Assim, a minha resposta é que muitos têm obtido tão segura certeza da esperança, como o nosso texto expressa, mesmo nestes nossos tempos modernos. Não posso admitir, nem por um momento sequer, que esse fosse um privilégio confinado aos dias dos apóstolos. Em nosso próprio país, muitos crentes, segundo tudo nos leva a crer, têm andado em comunhão quase que ininterrupta com o Pai e com o Filho e parecem desfrutar de um senso, quase incessante, da luz do rosto favorável de Deus a brilhar sobre eles. E muitos deles deixaram o registro escrito de suas maravilhas experiências. Isso tem acontecido e continua acontecendo – e é o bastante.
Em último lugar, a minha resposta é que não pode ser errado sentir-se confiante a respeito daquilo sobre o que Deus fala sem restrições; crer de modo resoluto quando as promessas de Deus são categóricas; ter certeza de haver recebido o perdão e a paz, quando descansamos na palavra e no juramento dAquele que jamais muda. É um completo equívoco supor que o crente que se sente seguro está dependendo de algo que ele vê em si mesmo. Ele simplesmente se escora no Mediador do Novo Pacto, bem como na veracidade das Escrituras. Ele crê que o Senhor Jesus quis exatamente aquilo que disse e aceita suas palavras como verdade. A segurança, afinal, não é nada mais do que uma fé plenamente desenvolvida. Trata-se de uma fé vigorosa, que se apega às promessas de Cristo com ambas as mãos, uma fé que argumenta à semelhança do bom centurião: “Apenas manda com uma palavra, e o meu rapaz será curado” (Mt 8.8). Assim sendo, por qual motivo o crente duvidará? (Estar certo de nossa salvação, diz Agostinho, não é auto-suficiência arrogante; é nossa fé. Não é orgulho; é devoção. Não é presunção; é promessa de Deus).
Podemos estar certos de que Paulo seria o último homem do mundo a apoiar o seu senso de segurança sobre a qualquer coisa pessoal. Aquele que se descreveu como sendo o principal dos pecadores (1 Tm 1.15), tinha um profundo senso de culpa e corrupção. Não obstante, tinha um senso ainda mais profundo do comprimento e da largura da retidão de Cristo lançada em sua conta. Aquele que foi capaz de exclamar: “Desventurado homem que sou!” (Rm 7.24), tinha uma visão ainda mais clara daquela outra fonte que pode remover “todo pecado e iniqüidade”. Aquele que se julgava como “o menor de todos os santos” (Ef 3.8), tinha um senso vívido e permanente de sua própria debilidade. Porém, tinha um senso ainda mais vivido daquela promessa de Cristo: “eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, eternamente” (Jo 10.28), estando absolutamente certo de que ela não poderia cair por terra.
Paulo sabia, provavelmente mais do eu qualquer outro homem, que ele era como um pobre e frágil fragmento de cortiça, flutuando em um oceano tempestuoso. Acima de qualquer outro, ele percebia as ondas agitadas e ouvia o rugido da tempestade que os circundava. Mais era nesse momento que ele deixava de olhar para si mesmo e passava a olhar para Jesus e nada temia. Ele lembrava-se da âncora que penetrará além do véu, a qual é “segure firme” (Hb 6.19). Ele lembrava-se da palavra, da obra e constante intercessão dAquele que o amará e que a Si mesmo se entregará por ele. E era justamente esse fator e não outra coisa qualquer, que o encorajava a dizer ousadamente: Uma coroa me está reservada, a qual me será dada pelo Senhor. E a concluir com a mais absoluta convicção: O Senhor me preservará até o fim, e jamais serei decepcionado.
Não terei de demorar-me mais sobre esse aspecto do assunto. Penso que todos podem admitir que mostrei que há bases reais e solidas para a afirmação que fiz, de que a segurança do crente é uma realidade bíblica.

Fonte: Livro “SANTIDADE” sem a qual ninguém verá o Senhor. J. C. RYLE. Pg 146-151.




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